O presidente da Comissão Episcopal da Mobilidade, antónio Vitalino, bispo de Beja, assina a mensagem para a semana das migrações, de 8 a 14 de agosto.
O presidente da Comissão Episcopal da Mobilidade, antónio Vitalino, bispo de Beja, assina a mensagem para a semana das migrações, de 8 a 14 de agosto. Nómadas da aldeia global
é lugar comum dizer-se que vivemos na aldeia global, onde tudo se divulga simultaneamente, chega ao conhecimento de todos e produz reacções semelhantes nos habitantes do pequeno Cosmos. No entanto, os efeitos residuais em cada pessoa são diferentes: uns aproveitam e sentem-se bem, enquanto outros ficam inseguros, insatisfeitos; uns alegram-se com os actos de terrorismo e outros protegem-se dele; uns têm mais que suficiente para uma vida cómoda no canto da aldeia e outros passam mal no outro canto; os que têm fazem turismo no canto onde se vive mal e os outros espreitam no outro, para conseguir o mesmo bem-estar.
E assim andamos, de um lado para outro, nesta aldeia, sem conseguirmos que a globalização seja também para todos em todas as dimensões: do saber, da economia, da solidariedade, da liberdade e da paz.
Emigrantes e Imigrantes
Nesta aldeia muitas vezes esquecemo-nos que os habitantes são pessoas e que têm uma igual dignidade fundamental. Não pode haver uns que são mais pessoas que outros, embora, na prática, isso aconteça. Para enfrentar os problemas que a globalização faz surgir é preciso partir da verdade fundamental: todos são pessoas e sujeitos de iguais direitos e deveres. Por isso, temos de considerar e acolher os migrantes, sejam pobres ou ricos, pessoas à procura de trabalho ou de lazer, trabalhadores ou turistas, como nossos semelhantes e interlocutores. Entrar em diálogo com eles e dar respostas adequadas, conscientes do princípio fundamental da cultura cristã: “não faças aos outros aquilo que não gostarias que te fizessem a ti”. Ou então aqueloutra recomendação do antigo Testamento: “lembra-te que também tu foste estrangeiro em terras do Egipto” (cf. Dt 5, 15 e 10,19).
acolher o outro é factor de renriquecimento
Na mensagem para o 91º Dia Mundial do Migrante e Refugiado, escrita pelo saudoso Papa João Paulo II, em 24 de Novembro de 2004, lê-se que “através do contacto com o outro se descobre o seu segredo e se contribui para um maior conhecimento mútuo”. Pelo diálogo intercultural vão-se esbatendo as barreiras e as agressões e constrói-se uma sociedade pacífica, onde as diferenças étnicas, linguísticas, religiosas e culturais são factor de enriquecimento das pessoas e da sociedade. Não se trata “de assimilar o estrangeiro, mas de integrá-lo na nossa convivência”, deixando de ver nele apenas um concorrente ou um factor de progresso económico, para ter nele um amigo, um irmão que caminha ao nosso lado e connosco luta por um mundo mais justo e fraterno.
é preciso ultrapassar os limites da tolerância, que muitas vezes é indiferença e se traduz em consequências negativas na convivência humana, para passar à atitude do diálogo acolhedor do outro, à simpatia que respeita as diferenças e as interpela para as compreender e integrar e, em alguns casos, esbater e superar numa síntese cultural de outra dimensão, que pode ser o princípio de uma nova cultura. Não devemos considerar as culturas como bens estáticos e imutáveis, mas como caminhos fecundantes da evolução social.
Da sociedade multicultural desenraizada à cidade integrada e pacífica
Sem cair num sincretismo cultural ou religioso, os diálogos intercultural, ecuménico e interreligioso ajudarão a construir uma nova sociedade, uma nova civilização, baseada no amor e no respeito da pessoa humana. é para esta atitude que apela a mensagem papal. Ela será aurora duma sociedade aberta e solidária, universalista, global em todos os sentidos, conforme a visão do profeta Isaías, que no exílio antevia um povo formado de todos os povos e de todas as línguas, reunido em volta de um único Deus e Senhor (Is 66).
Se enveredarmos por este caminho, temos futuro. Mas resta-nos um longo caminho a percorrer.como cristãos somos fermento dessa nova sociedade, testemunhas da esperança, peregrinos do Reino de Deus, sentinelas duma nova aurora.
Beja, 22 de Julho de 2005
antónio Vitalino, Bispo de Beja, presidente da Comissão Episcopal da Mobilidade