A 29 de janeiro de 2019, aniversário da fundação da congregação, os Missionários da Consolata assumiram oficialmente uma nova missão na diocese de Ambanja, em Beandrarezona, Madagáscar. Esta missão está sob a proteção da bem-aventurada Leonalla Sgorbati.
Durante muitos anos, Madagáscar foi um país desconhecido dos Missionários da Consolata que estão sempre à procura de novas terras de missão para anunciar a mensagem do Reino de Deus aos que ainda não foram evangelizados. Até que os três missionários pioneiros, padre Jared Makori, padre Jean Tuluba e padre Kizito Mukalazi, lá chegaram em março de 2019.
Madagáscar é um país com muito potencial: possui uma longa costa com a possibilidade de desenvolver a indústria pesqueira, bonitas praias que poderiam atrair o turismo e condições climáticas favoráveis para agricultura. Apesar dos seus recursos naturais, os níveis de pobreza são elevados, com 77 por cento da população a viver com menos de 1,90 dólares por dia. Os jovens, que constituem a maioria da população, são os mais afetados: 80 por cento vivem abaixo da linha da pobreza.
Beandrarezona está situada na região de Sofia, na província de Mahajanga, no distrito de Bealalana, a 1.124 metros acima do nível do mar. A população é de 21 mil habitantes, sendo o grupo étnico dominante o Tsimihety – pequenos agricultores que cultivam arroz, tabaco, amendoim, feijão e milho, e criam gado.
O distrito missionário de Beandrarezona tem apenas 716 católicos, 90 por cento dos quais são jovens e crianças. É uma situação de missão “ad gentes”, lugar de primeira evangelização. São 20 aldeias distantes umas das outras. A comunidade cristã mais distante está a 70 quilómetros de Beandrarezona, mas devido às montanhas e à falta de estradas são necessários quatro dias de caminhada para chegar
Cada comunidade tem entre cinco e 30 cristãos que não têm um lugar permanente de culto. Eles se reúnem numa casa ou constroem estruturas simples para as orações e reuniões.
A simplicidade e a humildade caracterizam o início desta nova missão. Não havia nenhuma casa destinada aos missionários. Foi preciso alugar uma que serve de residência e escritório. Transformou-se uma loja num quarto externo e o corredor serve de escritório e capela durante este tempo de pandemia. A outra ala da casa é ocupada pelo proprietário.
A caminhada dos missionários começou com a aprendizagem do malgaxe, a língua oficial do país· Esse idioma é peculiar. Enquanto em português, francês, inglês, italiano e swahili, a contagem começa da esquerda para a direita, em malgaxe é da direita para a esquerda. Por exemplo, 1.500 (mil e quinhentos), lê-se “quinhentos e um mil”. Leva tempo para se adaptar a este sistema.
Primeira evangelização
As atividades iniciaram-se com visitas às casas o que permitiu quebrar barreiras e criar laços de amizades e sentido de pertença. Esta atividade exige resistência e determinação para poder percorrer caminhos e estradas lamacentas, atravessar rios e locais montanhosos.
Na evangelização, existem numerosas oportunidades para fazer chegar a Palavra de Deus a todos os cantos do país. Várias regiões podem ser classificadas como lugares de primeira evangelização, uma vez que um bom número de pessoas nunca teve contato com o Evangelho. Nesse sentido, foi iniciada a formação de líderes e catequistas. O objetivo é criar um sentido de pertença para que eles transmitam o mesmo às comunidades cristãs que vão surgindo.
Culto aos antepassados
O contexto cultural e religioso é dominado pelo culto aos antepassados (mortos) que são os mediadores entre os vivos e o Ser Supremo. O elemento mais interessante é a “famahadiana”, regresso dos antepassados ou a exumação dos mortos. O povo malgaxe liga a eternidade ao túmulo ancestral e aos antepassados; por conseguinte, tanto o passado quanto o futuro encontram-se no túmulo familiar. A exumação é celebrada no esforço de louvar os antepassados.
A frequência da exumação depende de cada família. Normalmente é de cinco anos. Se o familiar falecido aparecer a um membro da família e lhe disser “estamos com frio”, significa um pedido para exumação. O astrólogo de família é consultado para determinar os melhores dias de exumação. O número de convidados e a quantidade de dinheiro a gastar são determinados pelos membros da família. No dia marcado, os membros da família alargada e os convidados vão aos túmulos dos familiares, que não estão longe das aldeias, com novos sudários e tapetes. Pelo caminho, o grupo canta e dança. No túmulo, todos circulam sete vezes à sua volta. Depois o ancião da família fala e anuncia aos antepassados a chegada de toda a família. Em seguida, os túmulos são abertos. Os ossos são exumados e colocados sobre o tapete e novos sudários (panos). Depois, os descendentes são convidados a dançar com os antepassados. As esposas ou mães falecidas são levadas nas mãos e os maridos e pais são carregados no ombro.
Os antepassados são envoltos em novos sudários e levados à aldeia acompanhados de música. Eles devem ocasionalmente ver a sua aldeia e permanecer nela durante um a três dias antes de serem devolvidos à sepultura. Então, eles olham para o futuro com confiança porque sabem que receberam a bênção dos antepassados.
Desafios da missão
Os desafios nesta missão são muitos. Por exemplo a falta de infraestruturas para realizar formação, o que obriga a utilizar a igreja como dormitório, refeitório e sala de encontro. Não existem instalações sanitárias e caixa de água para usar chuveiros. Outro desafio são as longas distâncias percorridas a pé pelas lideranças. Faltam estradas e meios de transportes como motocicletas. A maioria dos catequistas são idosos e têm dificuldades para percorrer longas distâncias e acabam por não fazer a formação.
Há uma unidade de saúde do governo com um pessoal médico, mas carece de um laboratório para realizar exames básicos e essenciais e não pode fornecer serviços de qualidade. O posto de saúde distrital mais próximo fica a 12 quilómetros e não há ambulância para transportar aqueles que necessitam de cuidados especializados. Os doentes são transportados por homens fortes usando cadeiras. Muitos, especialmente as mulheres grávidas que não podem ter partos normais, não resistem.
O nível de educação é baixo e muitos jovens não frequentaram a escola ou desistiram. A educação não é uma prioridade para um bom número de pais, embora a escola seja obrigatória dos seis aos 14 anos. Muitas crianças trabalham nas plantações de arroz, ajudam os seus pais a cuidar das vacas e em outros trabalhos. Os mais inteligentes gostariam de continuar os estudos, mas não podem pagar as mensalidades escolares e acabam por desistir. É uma experiência dolorosa por que, sem capacitar a geração jovem, Beandrarezona e a Palavra de Deus não poderão criar raízes mais profundas.
Na região existem quatro escolas das quais duas são privadas e nenhuma de nível secundário o que não permite uma educação de qualidade. Faltam materiais escolares essenciais e a maioria das escolas não dispõe de manuais. Um livro didático é partilhado por até 50 alunos. Os exames finais são escritos à mão e giz no quadro. A falta de energia elétrica representa um desafio ainda maior pois os alunos não conseguem ler ou fazer as tarefas escolares em casa. E, em Madagáscar, escurece por volta das 16h00.
Os jovens constituem a maior parcela da população o que representa um bom terreno para iniciar a pastoral juvenil e criar as condições para a animação missionária e vocacional. Há muitas oportunidades de evangelização através da promoção humana nas escolas, na área da saúde, na formação de lideranças e agentes de pastoral, em especial, catequistas que estão sempre na vanguarda. Outros campos a trabalhar são o da justiça, paz e integridade da criação, pastoral urbana e defesa da dignidade dos pobres e excluídos.
Texto: Kizito Mulakazi