As questões e os comentários tecidos à volta de hipotéticos despedimentos, em instituições da Igreja, não devem surpreender ninguém, mesmo quando mal-intencionados, pois, nem todo o jornalismo e programa editorial de meios de comunicação social se regem por códigos deontológicos a que estariam e estão obrigados.
Da Igreja, das suas instituições, a opinião pública espera exemplaridade, coerência entre o que anunciam-defendem e as suas práticas. Por isso, se já é desprezível o despedimento que acontece no âmbito das empresas, em instituições que têm por “sagrado” a dignidade do seu humano, a sua possibilidade é ainda muito mais ignóbil. O problema é que, quando a economia por detrás da gestão das instituições da Igreja é a mesma economia de mercado, assente sobre os fluxos e oscilações da oferta e procura, essa possibilidade pode mesmo tornar-se realidade.
Ao contrário do que por vezes se ouve dizer, a economia não tem de ser a mesma “economia da dívida” que tem hipotecado a vida, o tempo presente e futuro de um incontável número de pessoas em todo o mundo. Se o atual mercado responde à procura e se cria, sem escrúpulos, nas pessoas, outras tantas necessidades, às quais responde com mais estruturas, mais produtos, mais serviços, num crescimento económico imparável, e com a desculpa de que, com todos eles, milhares de novos postos de trabalho são criados, esta não tem de ser a forma de como a Igreja responde às necessidades dos seus fiéis ou do mundo em geral. Este não pode ser o seu “negócio” se não quiser de todo fazer parte dos grupos económicos que hoje “matam” e têm no dinheiro o seu alto-propósito, a sua idolatria.
A escassez de receitas que poderia, como razão, levar a despedimentos em instituições da Igreja, tem, na sua génese, um desenvolvimento com uma longa história, que não terá sido suficientemente pensado à luz da simplicidade do Evangelho, do que serve à vida como suficiente, tendo, no abrir de portas ao liberalismo e à sua economia, sucumbindo à sua tentação. Hoje, em tempo de pandemia, são as estruturas erguidas e mantidas no tempo, a grande questão que se coloca às paróquias, dioceses, santuários, instituições e congregações religiosas da Igreja. Não será fácil a resolução de questões imediatas, mas a reestruturação que tiver de ser feita com coragem não pode, no final, e numa resposta à pandemia, ser apenas sazonal, de ocasião, passageira. Ela terá de ter necessariamente em linha de conta à contínua situação de crise a tantos níveis com que nós vivemos todos os dias.