“A fome e a pobreza combinam-se com a desigualdade, choques climáticos, tensões sectárias e étnicas e queixas sobre terras e recursos, para desencadear e conduzir o conflito”, alertou o secretário-geral das Nações Unidas, sublinhando que uma das formas de alimentar as discórdias é deixar de alimentar as pessoas.
Em finais do ano passado, mais de 88 milhões de pessoas passavam fome aguda devido a conflitos e instabilidade, um aumento de 20 por cento, quando comparado com o ano anterior. E em 2021, essa tendência deve continuar. Por outro lado, sublinhou António Guterres, “o conflito força as pessoas a deixarem suas casas, terras e empregos, perturba a agricultura e o comércio, reduz o acesso a recursos vitais como água e eletricidade e aumenta a fome”.
Nas últimas décadas, o mundo avançou no combate à fome graças ao aumento da produtividade e à redução da pobreza global. Mas neste momento, “a fome não se refere mais à falta de alimentos”, mas à forma de atuar dos seres humanos. Os casos mais graves de insegurança alimentar estão em países com conflitos prolongados em grande escala. E os choques climáticos e a pandemia de Covid-19 estão a piorar a situação.
Guterres, que falava ao Conselho de Segurança da ONU durante uma sessão sobre segurança alimentar e conflito, anunciou a criação de uma Força-Tarefa de Alto Nível sobre Prevenção da Fome, liderada pelo subsecretário-geral para Assuntos Humanitários, Mark Lowcock. E apresentou como prioridade urgente os mais de 34 milhões de pessoas que já enfrentam níveis emergenciais de insegurança alimentar aguda.
Já o diretor-executivo do Programa Alimentar Mundial (PAM), David Beasley, recordou que a agência alcançou 114 milhões de pessoas durante o ano passado, o maior número de sua história, mas ressalvou que o mundo está “de novo a caminhar para a beira do abismo.”
As projeções de insegurança alimentar do PAM para 2021 são “verdadeiramente chocantes.” A agência espera que 270 milhões de pessoas enfrentem a fome. Para evitar “uma tragédia”, Beasley disse ser preciso olhar além das crises imediatas e investir na prevenção de conflitos porque “os custos financeiros dessa violência, sem falar nos custos humanos, são imensos”.