Jovens de vários pontos de Portugal e do mundo deslocam-se a Fátima e aí vivem experiências marcantes. São vários os encontros destinados a jovens que ocorrem na Cova da Iria. Um deles chama-se “Rumos”, tem diferentes etapas ao longo de um ano, e é promovido pelos Carmelitas Descalços desde 2015. Recentemente, o projeto teve mais um encontro e reuniu 15 jovens em Fátima, com o objetivo de ajudar os mais novos clarificar os seus percursos de vida.
Um impulso para a missão
Entre os participantes esteve Filipa Rocha, uma fisioterapeuta de 35 anos residente em Mafra, que recorda que há três anos o ‘Rumos’ lhe deu um “empurrão valente” para partir em missão para Cabo Verde, durante um ano. Antes da partida, Filipa envolveu-se num projeto em Portugal de angariação de bens para rechear um jardim de infância em São Vicente, que acolhia na altura 130 crianças, mas que não estava equipado. Faltava tudo. Filipa acompanhou “a logística do processo em Portugal”, a ida do contentor para Cabo Verde e depois ajudou a “equipar a creche”, em colaboração com as educadoras e auxiliares.
“Quando cheguei lá senti um amor, uma emoção e um conforto tão grande naquelas educadoras e crianças”, recorda Filipa. “Na altura tinha levado uns chupa-chupa de chocolate, que distribui pelos meninos, e então apercebi-me que eles só tiravam um bocadinho do chupa-chupa. Crianças de três, quatro, cinco anos. Eu disse-lhes que podiam comer porque eu tinha mais, e uma criança disse-me que aquele chupa-chupa tinha de durar para a semana toda”, lembra a fisioterapeuta, que ainda hoje recorda a “simplicidade” das crianças, a “alegria de comerem em pratos com garfo e faca e de terem uma mesa para poderem estar”.
Mais do que cuidados físicos
Atualmente, a fisioterapeuta de Mafra encontra-se a “reabilitar” vítimas da Covid-19, nomeadamente “pessoas que perderam o andar, que têm que saber voltar a respirar outra vez, de forma normal”. Através da sua experiência no ‘Rumos’ Filipa procura dar um cuidado integral às pessoas que tem ao seu cuidado.
“Não dou apenas o alento físico aos pacientes, mas procuro dar-lhes também o alento espiritual. O conforto de uma palavra. Muitas vezes a escuta é fundamental. Ficar em silêncio e trabalhar a escuta. Porque muitas pessoas, com o distanciamento, não têm com quem falar nem desabafar. Então acabamos nós por ter esse trabalho de escutar. As pessoas precisam de falar, de alguém que esteja em silêncio e que as escute”, afirma a profissional.
Apoio a jovens institucionalizadas
Carolina Freitas, de 30 anos, participou também no mais recente encontro ‘Rumos’. A jovem natural de Felgueiras viveu durante um ano num convento, mas a vida acabou por assumir outros caminhos. Vive há cerca de três anos na Cova da Iria e atualmente é animadora cultural numa instituição de crianças e jovens em risco em Fátima. Perante as menores institucionalizadas, Carolina afirma que procura ser “a presença de Deus naquelas crianças e jovens, algo que é muito difícil no mundo de hoje”.
“Quero ser, realmente, a presença de Deus, no século XXI, na vida delas. Gostava muito que elas tivessem essa sensação. Sinto que os jovens estão desordenados. Há uma desordem muito grande na vida de cada um, centrada nos valores mais supérfluos e mais rápidos que a sociedade incute, esta sociedade líquida”. “O ‘Rumos’ ajuda-me hoje a lidar com estas jovens”, acredita Carolina.
“Componente contemplativa e é algo que me fascina”
Pedro Silva tem apenas 17 anos, é de Vila Viçosa, está no 11.º Ano na área de Ciências, já participou em diversos encontros “Rumos”, e tem já bem delineado aquilo que pretende para o seu futuro. “Estou inclinado para a vida consagrada de vida ativa, como frade carmelita descalço. Se calhar depois padre. O ‘Rumos’ foi o que me ajudou a delinear este caminho. Em princípio, penso ir para a Universidade Católica do Porto tirar Teologia, e fazer vida comunitária já no convento” associado à “ordem dos carmelitas descalços”, conta o jovem Pedro, dando conta daquilo que o atrai no caminho que pretende seguir.
“Sou uma pessoa que gosta muito do silêncio e gosto muito de viver a oração e a ordem dos carmelitas descalços é uma ordem de vida ativa, mas tem uma forte componente contemplativa e é algo que me fascina”, destacou o jovem sorridente, adiantando que pretende “agir conforme as necessidades” a que for “chamado a responder”, e “ajudar quem precisa, seja espiritual ou algo mais prático”.
Uma ajuda para “cimentar a personalidade”
O mais recente encontro “Rumos” contou também com a participação de Mário Silva, de 27 anos, residente em Alcobaça e operador de câmara. Para o jovem que se encontra atualmente a fazer mestrado em Marketing, as respostas que encontra em Fátima assumem uma grande importância na sua vida.
“Saber aquilo que somos e aquilo a que estamos destinados ou que caminho queremos seguir torna-se muito importante para assumir todas as dimensões da nossa vida, inclusive a profissional”, refere o jovem, adiantando que estes encontros contribuem “para o autoconhecimento, ajudam a cimentar a personalidade e a formar aquilo que queremos ser”, considera.
“É a coisa mais bonita”
Todos estes jovens são acompanhados por religiosos, leigos e casais. Isabel Carreira faz parte da equipa orientadora do ‘Rumos’ e, juntamente com o marido, são um dos casais que acompanha estes jovens. “Procuramos criar espaço para que os jovens escutem a voz de Deus e também escutem os seus próprios sonhos, de forma a conectar essas duas realidades. Não é tanto o que nós falamos, mas as condições que se criam para que eles próprios descubram o seu próprio caminho. Nós não queremos impor caminho nenhum, mas possibilitar que cada um descubra o seu caminho, a sua vocação”, explica Isabel, adiantando que ao longo destes fins de semana se fala de “todas as vocações que há na Igreja”, e que se procura “apoiar o que as pessoas vão entendendo que é a voz de Deus”.
O último “Rumos” aconteceu de 14 a 16 de maio. O próximo terá lugar de 3 a 5 de setembro na Casa Domus Carmeli, em Fátima. Há em Isabel uma profunda gratificação por estar envolvida nesta iniciativa. “É um privilégio fazer este encontro, poder entrar na interioridade destes jovens, estar a acompanhá-los, acolher tudo o que eles nos querem manifestar porque há muita abertura, há uma sede muito autêntica e são miúdos muito bons. É uma gratidão aos jovens pela maneira como fazem este caminho, pela seriedade, pela abertura, pela confiança. Mas depois também uma gratidão muito grande a Deus por nos confiar estas pessoas, por nos permitir testemunhar o percurso e o caminho que fazem. Ver Deus trabalhar na vida de cada um. Isso é impagável, é muito belo. Não se paga com todo o ouro do mundo. É a coisa mais bonita”, realça Isabel.
Texto: Juliana Batista