Manuel Dias, sacerdote missionário da Consolata português, celebrou no passado dia 26 de dezembro as suas bodas de ouro sacerdotais, mas as celebrações dos seus 50 anos de sacerdócio tiveram início na última terça-feira, 13 de setembro, e prolongam-se até ao próximo domingo, dia 18, em Ferreira do Zêzere.
Depois de momentos de animação missionária, Eucaristia e recitação do terço, em espaços como o ATL da paróquia, e a Santa Casa da Misericórdia, para o próximo sábado, 17, está previso um momento de oração com a comunidade, assim como uma Missa vespertina. As celebrações chegam ao fim no domingo, 18, com uma Eucaristia de ação de graças.
O início da caminhada
Aos 85 anos, o religioso natural de Ferreira do Zêzere, ainda tem bem presente o dia da sua ordenação sacerdotal. Tinha então 35 anos. “Lembro-me muito bem porque fui ordenado na minha terra, em Ferreira do Zêzere, onde era muito conhecido. Recordo que foi um dia maravilhoso. Toda a comunidade estava presente. A celebração decorreu numa igreja que me diz muito porque lá tinha sido batizado, fiz a primeira comunhão, a profissão de fé, o crisma e também a ordenação. E isso para mim quer dizer muito. Ainda está lá a pia batismal onde eu fui batizado. Ter sido ordenado aí, para a minha gente que me conheceu desde sempre, para mim foi um dia muito importante.”
A sua opção pela vida religiosa foi muito bem recebida por todos quantos o rodeavam. “Tenho uma família muito numerosa. Atualmente somos 110. Os meus pais tiveram dez filhos, alguns já falecidos. A minha família acolheu-me muito bem. Viram-me sempre como um missionário e isso para mim foi também um apoio muito grande”, refere o religioso, que reflete sobre 50 anos de sacerdócio. “Para mim é um balanço muito positivo. Senti a presença de Deus na minha vida missionária, em Portugal e na Colômbia, onde estive em missão. Senti que Deus me acompanhava e que estava presente em tantas circunstâncias, particularmente na evangelização, na orientação das comunidades, das paróquias. Vi sempre uma presença de Deus muito forte”, realça.
O despertar para a missão
Em jovem, Manuel Dias considerava que a educação tinha uma dimensão fundamental, e por isso decidiu contactar uma professora para que esta o preparasse para o exame da 4ª classe, aos 19 anos de idade. Depois de cumprida essa etapa foi para a tropa, aos 20 anos. “Aí, numa das conferências que fazia o capelão sobre a vocação, achei que algo me poderia dizer respeito. Sentia que alguma coisa me tocava nessa reflexão. Quando terminei os 18 meses de serviço militar, contactei os missionários da Consolata em Fátima e entrei no seminário quando tinha 22 anos”, conta. Já na Consolata, o jovem de então fez o “liceu completo”. O noviciado foi feito em Itália. O estudo da filosofia aconteceu em terras italianas, mas também em Portugal.
Em solo nacional, Manuel Dias foi formador de seminaristas ao longo de 12 anos. Em 1984, o religioso tornou-se o primeiro missionário da Consolata português a ser enviado em missão para a Colômbia, onde foi missionário ao longo de 36 anos, passando por diversos pontos do país, ocupando diversas funções e acompanhando a construção de diversas infraestruturas.
As dificuldades de uma população acolhedora
“O povo colombiano tem muita atenção ao estrangeiro. Sabem que o estrangeiro foi para lá para ajudar. Aceitam-no muito. Estradas não há. As deslocações eram sempre a cavalo. Levavam um cavalo bom, para eu poder viajar. Tinham sempre uma cama muito bem preparada para eu poder dormir. Muito acolhedores. Mostravam muito carinho, apoio e atenção. Praticam muito a caridade”, lembra.
Durante o período de missão na Colômbia, o sacerdote tomou conhecimento das dificuldades enfrentadas por aquele povo. “A população vive do que produz no campo. Alguns criam animais, mas tornam-se difíceis de vender, e uma parte das pessoas dedicavam-se ao cultivo da cocaína. Tinham as suas reservas por lá escondidas em sítios que eu nunca consegui ver e produziam e vendiam para sobreviver. O grande sofrimento das pessoas era não terem com que sobreviver, com que comer. Isso era o grande problema.”
O sacerdote afirma que nunca teve problemas com os movimentos de guerrilha. “As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) estavam presentes. Conheciam-me. Quando ia a lugares perdidos na selva celebrar missas, passar um dia com o povo, eles iam, mas para ouvir o que o padre dizia. Eu sabia que eles estavam por lá. A minha missão era evangelizar e não meter-me em políticas e nunca tive problemas. Tive sempre todo o cuidado com as minhas palavras.”
No entanto, o missionário reconhece que o clima vivido no país se pode tornar esmagador para a população. “Oprime bastante porque as pessoas não são livres de poderem ir onde desejam. Não são livres. Podem ter consequências no sentido em que não podem sair. Não podem fazer o que querem, ou dizerem o que querem. Há uma certa opressão, um certo medo da parte das pessoas”, lamenta.
Uma relação inquebrável
O sacerdote deixou a Colômbia com a população a acreditar que iria apenas de férias. Esta situação ainda hoje deixa Manuel Dias muito emocionado. Os contactos entre as duas partes não cessaram. “Esperam sempre o dia do meu regresso porque, segundo eles, eu vim para Portugal, mas de férias. Não disse a ninguém que não voltaria. Disse que vinha de férias e despedi-me. Só depois de dois a três meses em Portugal é que comecei a falar da saúde, da idade, e, finalmente, acabei por comunicar que já não voltaria. Isso foi um grande golpe para eles. Escrevem-me muito, e muitos ainda me dizem – ‘Esperamos que venha, que volte!’”
Apesar da distância, o povo colombiano marca presença em cada dia do missionário. “Tenho sempre presentes as pessoas muito queridas, amáveis e disponíveis que conhecia na Colômbia. Rezo todos os dias por elas. Para que Deus as acompanhe e proteja”, conta o missionário. Em Fátima, aos 85 anos, Manuel Dias mantém-se ativo. Desloca-se com regularidade ao Santuário de Fátima, onde concede o sacramento da reconciliação aos peregrinos. Além dos fiéis de Fátima, transporta consigo as preces pelos colombianos, que inundam o seu coração de saudade.