Há dois aspetos, entre outros, “que me saltam logo aos olhos” e que têm muito a ver com a necessidade de reavaliar o estado da Igreja Católica: clericalismo e fraca participação na vida da comunidade eclesial. Porque destaco estes dois? Porque o primeiro é uma das razões para o atual estado da nossa Igreja, e o segundo é uma das principais consequências do primeiro. Passo a explicar: numa Igreja que insiste em centrar-se na figura dos líderes, sobretudo dos padres, a gradual falta de interesse numa participação ativa por parte dos fiéis é notória. Curioso é o facto de que este clericalismo é também laical, ou seja, há leigos que encontram na Igreja o único espaço onde podem “dar asas ao seu ego”, criando, por vezes, situações de conflito e de incompatibilidade com outros leigos e até mesmo com os párocos, pois “julgam-se donos daquilo tudo”. Muitos são os que, na humildade de um voluntariado ativo, vão questionando a própria continuidade no seio da comunidade eclesial, precisamente porque lhes é vedado o acesso à esfera das decisões, entre outras. Isto acontece com leigos, incluindo catequistas, com vários a desistir de uma participação ativa, e jovens “que se sentem pouco tidos em conta”, como diz a síntese feita na diocese do Porto.
A necessidade de mais proximidade e fraternidade
Em relação à “pouca participação” na vida da comunidade eclesial, sobretudo nas paróquias, temos visto um declínio acentuado neste período do pós-pandemia, sobretudo no que toca à participação na eucaristia dominical. É claro que a pandemia não é a única “culpada” deste fenómeno, se bem que ela tenha vindo a agravar a situação, sobretudo quando muitos pensam que “assistir à eucaristia pela televisão” é o mesmo que celebrá-la presencialmente na comunidade. Este declínio tem, a meu ver, outras razões que incluem não só o clericalismo, mas também a falta de formação bíblica e sacramental dos nossos fiéis: muitos são os que saem vazios de uma missa, porque não basta só celebrar, mas também crescer na fé e no conhecimento da mesma. Quanto à postura dos líderes religiosos em relação às comunidades, o Papa Francisco insistiu no dever, por parte destes, “em cheirar o cheiro das ovelhas”. Infelizmente, muitos são os que se mantêm distantes dos fiéis, fazendo com que, por exemplo, muitos venham a encher igrejas e salões de seitas cristãs, precisamente porque estas lhes dão o que na paróquia católica não encontram: proximidade, formação, espaço e tempo para escuta e partilha, linguagem mais simples e acessível a todos, entre outros. Ou seja, há muito espaço para melhorarmos como Igreja, sobretudo no que toca aos nossos líderes e à sua formação, ação e postura no seio das comunidades. Daí a importância deste sínodo, que nos deve ajudar a investir na qualidade de sermos Igreja que valoriza e promove os dons de cada membro.
Termino com um exemplo pessoal, que, a meu ver, reflete a necessidade desta proximidade entre líderes religiosos e outros agentes pastorais, da reformulação da linguagem litúrgica e da catequese para crianças, jovens e adultos, com uma atualização da mensagem e dos conteúdos da fé, sobretudo dos sacramentos da eucaristia e reconciliação, entre outros. Falo da procura crescente do sacramento da reconciliação, por parte de fiéis de várias comunidades paroquiais onde prestamos ajuda, que nos visitam para se confessar ou, simplesmente, desabafar, pois nem sempre têm quem esteja disponível para os escutar. É bom poder ajudar as pessoas a recuperar a autoestima e o sentido de pertença a Deus e a si mesmas, pois costumo dizer que não é só Deus que perdoa. Também temos de nos perdoar e amar a nós próprios, senão não poderemos amar o próximo. Este é um dos muitos exemplos do que devemos recriar e partilhar na vivência da nossa fé: quanto mais formados, reconhecidos e participativos formos, mais testemunho alegre e credível daremos ao mundo de Deus em nós!
Texto: Álvaro Pacheco, missionário da Consolata