Os piores acontecimentos da história foram também momentos de profundo desrespeito pelos outros. As alterações climáticas parecem conduzir-nos rapidamente para mais um desses momentos trágicos. A curto prazo, devido à incapacidade de uns, no seu conforto, pensarem no drama de tantos que se encontram nas zonas mais desprotegidas do mundo. A longo prazo, por sermos incapazes de tomar medidas no presente que viabilizem o futuro das próximas gerações.
A maioria dos comentários sobre a Cimeira do Clima das Nações Unidas que decorreu em Sharm el-Sheikh, no Egito, tenderam a fazer um balanço simultaneamente positivo e negativo do encontro. No elemento positivo, realça-se o facto de, pela primeira vez, se ter conseguido chegar a um acordo mundial sobre a criação de um fundo para financiar as perdas e danos das nações mais vulneráveis aos efeitos das alterações climáticas. No ponto negativo, salienta-se o facto de a cimeira não ter conseguido evoluir acerca das emissões de gases com efeito de estufa, responsáveis pelo aumento das temperaturas e as alterações climáticas do globo.
Se tivermos em conta que, relativamente ao fundo financeiro para as perdas e danos, não foi definido nem o montante nem as condições de acesso a eles, talvez sejamos obrigados a concluir que a Cimeira do Clima das Nações Unidas resultou em muito pouco. Na prática, sem novos objetivos para as emissões de carbono, os países mais ricos limitaram-se a deitar dinheiro sobre os problemas, com a vaga promessa de aliviar prejuízos dos países mais afetados pelas alterações climáticas, mantendo, em contrapartida, os seus interesses económicos e de desenvolvimento intactos.
Por um quinhão de futuro
O acordo alcançado em Sharm el-Sheikh omite uma contabilidade difícil: quanto será necessário para compensar o Paquistão pelas vítimas e pela destruição causadas nas cheias que inundaram um terço do seu território? E como compensar as populações de inúmeras ilhas do pacífico quando, dentro de duas décadas, a subida do nível do mar submergir as terras que habitam?
Em Portugal, jovens surpreenderam o país pela ocupação de vários estabelecimentos de ensino, exigindo medidas políticas em favor do ambiente e a redução do consumo dos combustíveis fósseis. Na sequência destas manifestações, quatro jovens foram detidos e julgados. Noutros países, jovens procuram chamar a atenção dos media para as alterações climáticas, com ações consideradas radicais e de sentido questionável, como atirar sopa contra quadros célebres. O escândalo causado nos media e na opinião pública foi, precisamente, o efeito pretendido com tais iniciativas. Em reação, questionou-se o facto de algumas das suas reivindicações serem irrealizáveis, incongruentes, pouco sustentadas… mas ainda ninguém lhes respondeu como pensam garantir-lhes o seu quinhão de mundo no futuro que eles, justamente, reivindicam.
Texto: Carlos Camponez