Luca Bovio é um sacerdote missionário da Consolata italiano que trabalha na Polónia desde 2008, e fez parte de uma viagem humanitária da Cáritas à Ucrânia. Um dos sinais mais marcantes desta guerra é, segundo o padre Luca, a escuridão que recebeu a comitiva após entrarem no país, por causa da falta de eletricidade, situação agravada depois dos ataques às centrais elétricas no passado mês de outubro.
A delegação da Cáritas foi acolhida por Vitaliy Skomarovskyi, bispo de Lutsk, segundo o qual o maior problema que a sua diocese e áreas circundantes enfrentam é, para além da falta de eletricidade, o crescente número de prófugos que chegam da parte leste da Ucrânia. O centro da Cáritas da diocese distribui semanalmente ajuda alimentar a cerca de 300 famílias. Graças ao contributo de vários benfeitores, a delegação polaca da Cáritas pôde entregar uma generosa quantia monetária para a compra de alimentos e outros bens de primeira necessidade.
A partir de Lutsk, a delegação seguiu para a capital Kiev onde, ao contrário de julho, aquando da última visita, o número de controlos militares tinha diminuído. A cidade mostrava ainda muitas ‘feridas’ causadas pelos ataques, quer em prédios, quer noutras estruturas da cidade. De acordo com o núncio apostólico, Visvaldas Kulbokas, que acolheu a delegação polaca, a vida em Kiev decorre da forma mais normal possível, com a eletricidade a ser usada a determinadas horas, para que todos possam ter alguma. Esta situação obriga, por exemplo, a que muitas pessoas tenham que usar as escadas em prédios bastante altos, alguns com 30 andares.
A viagem prosseguiu depois em direção a Charkiw, a segunda maior cidade ucraniana, situada a 30 quilómetros da fronteira com a Rússia. Antes da guerra, iniciada a 24 de fevereiro de 2022, a cidade tinha 3 milhões de habitantes. Em novembro eram pouco mais de um milhão. Os ataques têm sido quase ininterruptos, quer na cidade, quer na província a que pertence. Também aqui, a Cáritas se mantém solidária com a população, sob a direção do padre Wojciech, natural da Polónia e diretor da organização há seis anos. A delegação polaca, ajudada por dois voluntários da Cáritas, é depois acompanhada na visita a várias zonas populares. Para além da falta de eletricidade, a população vive imersa em muitas outras dificuldades. Porém, como descreve o padre Luca, a simplicidade e o sorriso com que são acolhidos “derretem o coração” dos voluntários polacos.
As condições de vida são muito difíceis mas, ao mesmo tempo, mostram o espírito de resiliência deste povo. Uma forma de solidariedade entre os habitantes é a partilha do sinal de internet, fundamental para alimentar a esperança de tantos, pois facilita a comunicação com familiares e amigos. É também notória a forma como as caves foram adaptadas de modo a permitir a convivência de dezenas de pessoas cujas habitações foram total ou parcialmente destruídas. Numa aldeia do sudeste, a diretora de uma escola, depois de mostrar os danos causados pelos ataques, refere que o que é mais necessário neste momento é “que as crianças possam regressar à aldeia e à escola”.
No penúltimo dia da viagem, o padre Luca e amigos puderam assistir a outra distribuição de ajuda, por parte da Cáritas ucraniana. Em média, a organização ajuda numa tarde cerca de duas mil pessoas, 30 mil em duas semanas. Cada família pode receber ajuda uma vez a cada duas semanas. Infelizmente, as necessidades não param de aumentar, e agravam-se com o início do inverno que na Ucrânia é sempre duro e rigoroso. Porém, a solidariedade de tantas pessoas, entidades e países, irá certamente impedir que a chama da esperança se apague.
Texto: Álvaro Pacheco, missionário da Consolata