A Venezuela e a Guiana aceitaram resolver o diferendo sobre a região do Essequibo, por via das negociações que deverão iniciar-se nos próximos meses sob a mediação do Brasil. A decisão foi tomada depois de um encontro entre o presidente Irfaan Ali, da Guiana, e Nicolás Maduro, da Venezuela, que fez baixar a tensão entre os dois países. Em causa está uma região de cerca de 160 mil quilómetros quadrados de floresta tropical, com um subsolo rico em petróleo, gás, diamantes, ouro, alumínio, ferro e cobre.
A tensão verificou-se depois de Nicolás Maduro ter decidido fazer um referendo a 3 de dezembro, em que, segundo o governo, 95 por cento dos votantes aceitaram a criação do estado venezuelano de Essequibo, assim como a atribuição da nacionalidade venezuelana a todos os residentes da região.
A iniciativa, a concretizar-se, corresponderia a uma anexação do território atualmente detido pela Guiana, provocando a preocupação da ONU, a rejeição da Organização dos Estados Americanos, enquanto os Estados Unidos da América (EUA) e a Guiana decidiam realizar manobras militares conjuntas. O território é disputado há mais de 100 anos, mas as descobertas, em 2015, de novas jazidas de petróleo aumentaram as atenções sobre o futuro da região. No ano passado, a Guiana, o único país de língua inglesa da América Latina, registou um aumento do Produto Interno Bruto de 58 por cento.
Dois terços do território da Guiana
Em 1811, aquando da autoproclamação da independência da Venezuela face à Espanha, a região de Essequibo integrava os territórios da então nova república. No entanto, a Grã-Bretanha aproveitou-se da instabilidade política da região e do seu poder de potência militar para ir alargando os territórios daquela que começou por ser uma colónia dos Países Baixos. Simón Bolívar, quando presidiu à primeira união de nações independentes da América Latina, reivindicou os território a Oeste do rio Essequibo, que estavam a ser colonizados indevidamente pela Grã-Bretanha. Em 1840, quando os britânicos definiram os novos limites da sua colónia da Guiana, a Venezuela, com o apoio dos EUA, contestou o novo traçado.
O diferendo acabou por ser resolvido a favor da Grã-Bretanha por um tribunal arbitral internacional, reunido em 1899, em Paris. Porém, décadas mais tarde, veio a saber-se, num memorando divulgado após a morte de um jurista norte-americano que representou os interesses da Venezuela no tribunal, que a decisão resultou de um entendimento ilegítimo entre a Grã-Bretanha e a Rússia.
Em face disso e na sequência de uma queixa apresentada pela Venezuela na ONU, Londres assina, em 1966, três anos antes de dar a independência à Guiana, um acordo com Caracas onde as duas partes aceitam resolver o diferendo por via diplomática. Para Caracas, o acordo com Londres significa a anulação da decisão do tribunal arbitral de 1899. Mas para as autoridades de Georgetown, a capital da Guiana, as pretensões da Venezuela representam alienar cerca de dois terços do seu território e uma região rica em minerais e petróleo.
Texto: Carlos Camponez