Numa reunião recente de comissões justiça e paz europeias, impressionou-me a convicção de um colega ucraniano a respeito da vitória do seu país na guerra, uma guerra que, nas suas palavras, deverá ser ganha “custe o que custar” e “demore o tempo que demorar”. Somos solidários com o sofrimento do povo ucraniano e reconhecemos o seu direito de defesa, mas ao ouvir esse meu colega, não pude deixar de recordar o que afirma o Papa Francisco – “Ninguém ganha com uma guerra”.
Esse meu colega considera utópica qualquer tentativa de negociação diplomática, mas também me pareceu algo utópica a vitória incondicional de uma das partes. O que parece certo é apenas o contínuo acréscimo de mortes e de destruição. Ao admitir uma guerra, ainda que defensiva, parece que se esquece que, de acordo com a doutrina da Igreja, não basta que uma guerra seja defensiva para que seja legítima. Como tem salientado o Papa, nunca se deve desistir da diplomacia.
Num contexto diferente, ouvimos responsáveis do governo de Israel, perante os ataques terroristas do Hamas, invocar a legítima defesa para justificar uma guerra que elimine, de vez, essa organização. O governo de Israel não tem recuado diante da ocorrência de vítimas civis dos seus ataques. Esquece que o direito de defesa, não só não se confunde com a retaliação (a vingança, a resposta a um mal com outro mal), como está sujeito a limites no seu exercício, a critérios de necessidade e proporcionalidade. Que o Hamas se sirva de civis como ‘escudos humanos’, faz sobre ele recair graves responsabilidades, mas não exclui a responsabilidade de quem diretamente os atinge mortalmente. E também será ilusória a pretensão de eliminar definitivamente o Hamas. Ele poderá continuar a provocar ataques terroristas em qualquer parte do mundo enquanto houver quem adira aos seus objetivos de destruição do Estado de Israel.
Com as mortes e destruições que hoje atingem o povo palestiniano, serão certamente muitos mais, e não menos, os que aderem ao Hamas. Não podemos esquecer que uma solução duradoura destes recorrentes conflitos na Terra Santa passará sempre por enfrentar a sua raiz, por uma paz alicerçada na justiça que implique o respeito de todos os direitos legítimos dos povos israelita e palestiniano.
Pedro Vaz Patto, Presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz
Texto conjunto Missão Press