O Egito negociou, em fevereiro, um auxílio financeiro suplementar com o Fundo Monetário Internacional (FMI) no valor de cinco mil milhões de euros, destinados a evitar que o país caia na bancarrota. Com uma situação económica difícil, o presidente egípcio vê aumentar a polémica em torno das obras faraónicas de construção da nova capital, a cerca de quatro dezenas de quilómetros a Este do Cairo, responsáveis por uma grande parte do défice externo do país.
A cidade resulta de um projeto que data dos anos 70 e que visa a desobstrução urbana do Vale do Nilo, onde se situam as únicas terras aráveis do Egito. No entanto, os críticos não deixam de notar que o projeto visa também proteger a administração egípcia de situações como as que ocorreram durante a revolta da população, em 2021, que conduziu à queda do regime de Hosni Mubarak. Durante a rebelião, as forças policiais e militares revelaram uma grande dificuldade em atuar sobre os acontecimentos numa cidade atravancada, onde diariamente vivem e trabalham cerca de 21 milhões de habitantes.
Os críticos do projeto da nova cidade consideram que ela não só vai vincar as desigualdades, como procura, com o dinheiro de todos, proteger as elites políticas e económicas. Com efeito, os custos da habitação da nova capital só serão acessíveis a uma parte reduzida da população. Em 2020, a nova capital do Egito representava já cerca de 46 por cento do total da dívida externa egípcia, atualmente calculada em cerca de 147 mil milhões de euros, e considerada a segunda maior do mundo, a seguir à Argentina. Na nova Capital, implantada no deserto, estão a ser construídos espaços para grandes zonas verdes, um rio artificial, palácios presidenciais e de governo, assim como um complexo administrativo e militar maior que o Pentágono, nos Estados Unidos da América.
60 por cento de pobres ou em risco de pobreza
O auxílio financeiro do FMI ao Egito traz consigo mais medidas económicas restritivas, como a desvalorização da moeda e a subida da inflação. Esta situação vem agravar as condições de vida da população, estimando-se que cerca de 60 por cento sejam pobres ou estejam em risco de cair na pobreza.
Com a guerra na Ucrânia e na Faixa de Gaza, o Egito viu baixar substancialmente duas das suas fontes históricas de financiamento. Cerca de 40 por cento dos turistas que visitavam o país eram russos e ucranianos. Também as receitas provenientes da circulação marítima pelo canal do Suez caíram 50 por cento, desde que os houthis, do Iémen, passaram a atacar navios no Mar Vermelho.
O Egito é também o maior importador de trigo do mundo. As perturbações no abastecimento de trigo, resultantes da guerra na Ucrânia, contribuíram para que os produtos alimentares aumentassem 37,2 por cento no ano passado. Neste contexto, estima-se que o terceiro mandato do presidente Abdul Fatah Khalil Al-Sisi venha a ser particularmente difícil e que o país possa enfrentar novas convulsões sociais.
Texto: Carlos Camponez