“A minha reação é de espanto por aquilo que não costuma acontecer no Porto e, obviamente, da mais radical condenação.” O comentário é de Manuel Linda, bispo do Porto, em resposta a uma pergunta do 7Margens sobre se havia alguma reação da Diocese aos acontecimentos da madrugada de sexta-feira passada na cidade, com agressões a vários imigrantes.
A pergunta do 7Margens justificava-se pela ausência de qualquer tomada de posição pública do bispo, ou de algum organismo da diocese, sobre aqueles graves acontecimentos, apesar de sobre eles já terem passado mais de três dias e já ter havido reações de vários quadrantes. Igualmente significativo é o facto de televisões, jornais e rádios que tão largamente questionaram os mais diversos grupos, instituições e organizações não terem conseguido obter, ou sequer pensar em obter, um comentário do bispo da cidade.
Recorde-se que na madrugada de sexta-feira, mais de uma dezena de imigrantes foram atacados em três lugares diferentes da cidade. Num dos ataques, de acordo com as informações vindas até agora a público, dez imigrantes estavam na sua residência quando um grupo de uma dezena de homens entrou e, munido de paus, agrediu os residentes.
Na sua resposta, o bispo do Porto remeteu para mais declarações que fizera momentos antes à agência Ecclesia. Aqui, lembrando a “tradição respeitadora e acolhedora da diferença” da cidade, Manuel Linda deplorava e rejeitava as agressões da última semana: “Lamento profundamente e rejeito com toda a veemência cenas de violência que não têm cabimento em lado nenhum, muito menos nesta cidade que é de tradição respeitadora e acolhedora da diferença”, afirmou, acrescentando que essas agressões não se podem “tolerar”.
No domingo, perante milhares de estudantes finalistas dos cursos universitários, o bispo Manuel Linda não se referiu, no entanto, ao tema: falando do amor a partir dos textos bíblicos da missa, afirmou que ele “deve ser levado muito a sério, pois como dizia Paul Beauchamp “quem se abstrai disto, ama o oposto da vida”. E disse que o “amor é doação”, seja “voltado para o lado, para os irmãos” ou “dirigido para cima, para Deus”. Dirigindo-se aos finalistas na missa da assim chamada Bênção das Pastas, acrescentou: “Amor é exerceres a tua futura atividade profissional pensando que, por ela, vais suprir muitas carências humanas, colmatar lacunas e dificuldades, enxugar lágrimas e medos, favorecer harmonias e diálogos, contribuir para o desenvolvimento integral da sociedade, apoiar relações intensas e gratificantes, acalentar a esperança, estabelecer a verdade e a justiça, libertar das opressões, tornar a mesa de todos mais farta de pão, gerar maior qualidade de vida, enfim, dar o contributo insubstituível para que as pessoas se humanizem, o mundo se fraternize e a humanidade vença a tirania do materialismo, essa cortina espessa que sufoca porque nos barra os horizontes da luz, da verdadeira liberdade, da plenitude, da eternidade. (…) Ou seja, não amando em teoria, na generalidade, mas em concreto. Os outros têm nome e têm rosto, estão todos os dias comigo em casa, na universidade, no trabalho, na rua. Estão nas redes e por onde circula a vida. De perto e de longe.”
O bispo Linda ainda fez uma referência ao cinquentenário do 25 de Abril para dizer que “a Igreja é, também, uma casa de liberdade para todos”, mas não se referiu a nenhum dos atos ocorridos na sexta-feira. Também no domingo, acrescente-se, o bispo foi homenageado pelo Observatório Internacional de Direitos Humanos como “Embaixador da Paz, da Boa Vontade e da Tolerância”, uma distinção que o próprio diz que é um reconhecimento à “Igreja do Porto, que procura estar com atenção aos direitos das pessoas e fundamentalmente na boa relação com outras religiões e com outras minorias”. Recordando também o “acolhimento de muitas outras pessoas que podem até não ter religiões ou são indiferentes ao fenómeno religioso” ou, ainda, a disponibilização de instalações da diocese para o acolhimento de ucranianos e imigrantes de outras nacionalidades, Manuel Linda destacou ainda a “história de bom acolhimento” e de “defesa dos Direitos Humanos” da Diocese do Porto.
Texto publicado ao abrigo da parceria da revista FÁTIMA MISSIONÁRIA com o jornal digital 7Margens.