Palestinianos procuram sobreviventes nos escombros de um prédio destruído por um ataque israelita, num campo de refugiados do sul da Faixa de Gaza, a 16 de outubro | Foto: Lusa

Assumir uma posição pública e inequívoca contra o genocídio em curso em Gaza, como no passado fez sobre a invasão da Ucrânia. É este o repto que 90 professores e investigadores da Universidade do Minho (UM) lançam ao reitor e à presidente do conselho geral desta instituição académica. Para além disso, exigem a interrupção de qualquer cooperação científica com Israel, bem como que se efetuem parcerias académicas com a Palestina.

“O terror progride em Gaza. Mais de 37 mil mortos, dos quais 20 mil crianças. 70% das estruturas civis destruídas. A fome e a sede usadas como armas de guerra. Simultaneamente, a arbitrariedade e a violência acentuam-se de forma intolerável nos territórios ocupados de toda a Palestina. É neste contexto que os 90 abaixo-assinados, professores/as e investigadores/as da Universidade do Minho, querem publicamente manifestar-se solidários e próximos dos muitos milhares de vítimas do genocídio em curso”, contextualiza o documento, que pode ser lido na íntegra nesta ligação.

No texto, os signatários congratulam-se também “com as posições desassombradas assumidas por estudantes em todo o mundo e, também, no nosso país” e na Universidade do Minho. “São as suas vozes que, no meio de um ensurdecedor silêncio, e por vezes enfrentando a agressão policial, se têm erguido contra a metódica destruição de Gaza e a violência extrema que há décadas se exerce sobre a Palestina.”

Luís Soares Barbosa, professor catedrático no departamento de Informática da Universidade diz ao 7MARGENS que este ato conjunto surge da estranheza que vários membros da comunidade académica sentiram face à “ausência de uma posição explícita e substantiva da Universidade sobre o genocídio em Gaza, sobretudo em comparação com a rapidez com que esta instituição tomou uma posição parecida aquando da invasão da Ucrânia pela Rússia”.

“As universidades são instituições de saber, de valores humanistas, de valores das Luzes e, portanto, não podem pactuar com uma situação tão aberrante como aquela que se vive em Gaza. Por outro lado, e nós dizemos isso também na carta, entre os milhares de mortos que tem havido em Gaza, uma grande percentagem são crianças e jovens, muitos dos quais têm a idade dos nossos alunos”, refere Barbosa.

“Isso é para nós particularmente tocante. As pessoas que nós temos nas salas de aula todos os dias, cheias de ideias, de sonhos, com direito a uma vida e a um futuro abertos, em Gaza estão a ser chacinadas em nome de uma política colonial velha de 70 anos e que tem sido desde então um desastre.” Por estas razões, os signatários consideram que a Universidade do Minho tem a obrigação de tomar uma posição”, acrescenta.

O documento pede, além de “uma posição pública e inequívoca contra o genocídio em curso”, que a UM “suspenda toda a cooperação com o Estado de Israel” e com empresas e instituições académicas israelitas que “contribuam para a ocupação, o terror e a violação grosseira do direito humanitário internacional” e que, pelo contrário, a Universidade se mostre “disponível para cooperar com as instituições de ensino, investigação e cultura palestinianas (…), muitas já completamente destruídas”. Pede ainda que a instituição não exiba “a bandeira ou qualquer outra insígnia do agressor” e que “exerça toda a sua capacidade de influência para exigir um cessar-fogo imediato, incondicional e definitivo”.

Os signatários são oriundos das escolas de Engenharia, de Letras, Artes e Ciências Humanas, de Economia e Gestão, de Direito, de Ciências, de Medicina, e de Psicologia, bem como dos institutos de Ciências Sociais, e de Educação. Há ainda professores e investigadores dos centros de Investigação em Educação, Interdisciplinar de Ciências Sociais, de Estudos de Comunicação e Sociedade, de Estudos Humanísticos, e de Ética, Política e Sociedade, bem como do Arquivo Distrital de Braga.

ONU confirma crimes de guerra e contra a humanidade em Gaza e Israel

A Comissão Internacional Independente de Inquérito das Nações Unidas sobre o Território Palestiniano Ocupado divulgou entretanto, na última quarta-feira, 12 de junho, um relatório em que evidencia que as autoridades israelitas são responsáveis por crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos durante as operações militares e os ataques em Gaza. Para além disso, o documento também conclui que os grupos armados palestinianos são responsáveis por crimes de guerra cometidos em Israel. “É imperativo que todos aqueles que cometeram crimes sejam responsabilizados”, referiu Navi Pillay, presidente da Comissão. A única forma de pôr termo aos ciclos recorrentes de violência, incluindo a agressão e a retaliação de ambas as partes, é garantir o estrito cumprimento do direito internacional”.

“Israel deve cessar imediatamente as suas operações militares e os seus ataques em Gaza, incluindo o assalto a Rafah, que custou a vida a centenas de civis e deslocou novamente centenas de milhares de pessoas para locais inseguros, sem serviços básicos e assistência humanitária”, mencionou Pillay. “O Hamas e os grupos armados palestinianos devem cessar imediatamente os ataques com foguetes e libertar todos os reféns. A tomada de reféns constitui um crime de guerra”, acrescentou.

No que diz respeito às operações e ataques militares israelitas em Gaza, a Comissão considerou que as autoridades israelitas são responsáveis pelos crimes de guerra de fome como método de guerra, homicídio ou morte intencional, dirigir intencionalmente ataques contra civis e objetos civis, transferência forçada, violência sexual, tortura e tratamento desumano ou cruel, detenção arbitrária e ultrajes à dignidade pessoal. Este órgão concluiu que foram igualmente cometidos crimes contra a humanidade de extermínio, perseguição sexual contra homens e rapazes palestinianos, assassínio, transferência forçada, tortura e tratamentos desumanos e cruéis.

Nas suas recomendações, o relatório insta o Governo de Israel a aplicar imediatamente um cessar-fogo, a pôr termo ao cerco de Gaza, a garantir a entrega de ajuda humanitária e a pôr termo ao ataque contra civis e infraestruturas civis. O documento também apela ao Governo do Estado da Palestina e às autoridades de facto de Gaza para que cessem imediatamente todos os ataques com rockets contra Israel, libertem incondicionalmente todos os reféns e investiguem de forma exaustiva e imparcial as violações cometidas. Solicitam, de igual modo, que as autoridades palestinianas julguem os responsáveis pelos crimes, incluindo os cometidos em 7 de outubro e desde essa data por membros de grupos armados palestinianos não estatais em Israel.

Texto redigido por José Alberto Catalão/7Margens, ao abrigo da parceria com a Fátima Missionária.