Manuel Magalhães nasceu em Ermesinde e esteve em missão em Moçambique entre 2000 e 2014. Domingos Forte é natural de Guimarães e entre 2004 e 2014 desenvolveu trabalho missionário no Brasil | Fotos: DR

Domingos Forte e Manuel Magalhães são sacerdotes Missionários da Consolata, e foram ordenados na mesma cerimónia, que decorreu na repleta Igreja Paroquial de Ermesinde, há precisamente 25 anos, a 25 de setembro de 1999. O bispo ordenante foi Armindo Coelho, então bispo do Porto. Domingos é natural de Guimarães, tem 56 anos, e foi ordenado aos 31. Manuel é natural do Porto, tem 53 anos, e foi ordenado aos 28. Ambos estão prestes a celebrar as suas bodas de prata sacerdotais, e em declarações à FÁTIMA MISSIONÁRIA recordam as vivências que a vida missionária lhes tem proporcionado.

Entre o povo da Bahia
Com apenas 11 anos, Domingos Forte conheceu os Missionários da Consolata quando estes se deslocaram à escola onde estudava. Apenas um ano depois desse momento, que considera ter sido “extraordinário”, entrou para o Seminário da Consolata de Águas Santas. Corria o ano de 1981. “A partir daí, foi como entrar num ‘carrocel’ que, até hoje, ainda não parou”, destaca. A sua formação passou depois por Fátima, Abrantes e Lisboa. Fora de Portugal, estudou em Itália e Espanha.

“Antes de dar o último passo para a ordenação, solicitei que me concedessem a oportunidade de realizar uma experiência pastoral, se possível, longe da Europa. E assim foi: fui enviado para a paróquia de São Miguel de Cuamba, no Niassa, em Moçambique. Foi uma verdadeira bênção. Devia mencionar todos e cada um dos nomes daqueles que tornaram estes dois anos de estágio um autêntico ‘farol’ que, desde então, ilumina e norteia cada passo da minha vida”, lembra.

A 21 de janeiro de 2004, Domingos iniciou um amplo trabalho missionário no Brasil, onde permaneceu até 2014. Trabalhou em diversos pontos do Estado da Bahia, onde afirma que viveu uma “intensa atividade pastoral paroquial”, que contemplou a “catequese, celebrações, retiros, formação, animação missionária e vocacional, e acompanhamento de jovens que se preparavam para ingressar no seminário”. Ali, foi pároco de comunidades que considera “vivas, dinâmicas e com uma sede insaciável de aprender, conhecer e celebrar o Evangelho de Jesus”.

A preparação da Jornada Mundial da Juventude, que ocorreu no Rio de Janeiro, em 2013, está entre as melhores memórias do missionário, que ainda recorda como foi tão trabalhosa a preparação de todo o encontro, e de como ele, e tantos jovens, puderam “realizar o sonho de dormir e acordar ao som das ondas de Copacabana”, e das palavras cheias de esperança do Papa Francisco.

As dificuldades em que vivem tantos brasileiros fazem parte das preocupações do missionário. “Portugal cabe cinco vezes dentro do Estado da Bahia. É normal, por isso, que as dificuldades sejam assinaláveis. O que quer que se faça, é sempre pouco para solucionar os problemas. Até há pouco tempo, os poderes ignoraram olimpicamente esta parte do território brasileiro. De há uns anos para cá, porém, quase como por milagre, as atenções viraram-se para o paradisíaco nordeste do Brasil. Os motivos são vários. Por um lado, lugares lindíssimos e gente alegre e acolhedora fizeram o turismo intensificar-se. Por outro, a descoberta de jazidas de minerais preciosos e de condições especialíssimas até para a produção de vinho, levaram multinacionais para aquele território. No campo religioso, os interesses pelo pobre povo nordestino explodiram repentinamente, e a chegada de toda a espécie de seitas e de igrejas evangélicas, que não têm nada a ver com o Evangelho de Jesus de Nazaré, tem sido simplesmente assustadora. A lista de dificuldades já era numerosa antes da ‘descoberta’ do nordeste por parte de turistas, empresários e pastores, e agora, a situação piorou”, lamenta.

O sacerdote afirma que os “tesouros mais deslumbrantes que a vida missionária” lhe deu e continua a dar, “são as pessoas”. Atualmente, Domingos dedica-se ao “acompanhamento pastoral e paroquial” de três comunidades do arciprestado de Guimarães e Vizela, da arquidiocese de Braga, e faz um balanço muito positivo dos seus 25 anos de sacerdócio. “Trabalhar na única Igreja que Jesus deixou é de arrepiar. Jesus confiou nos 12 que chamou, e creio que hoje continua a confiar naqueles e naquelas que lhe dizem ‘Sim’ com alegria e generosidade.”

À descoberta de Moçambique
Foi também aos 11 anos e em contexto escolar que o padre Manuel, natural de Ermesinde, teve conhecimento da existência dos Missionários da Consolata. A sua entrada para o Seminário da Consolata de Águas Santas deu-se em 1983. O seu percurso formativo continuou depois em Fátima, Abrantes e Cacém, e em Itália passou por Vittorio Veneto e Roma.

Em agosto de 2000, o padre Manuel partiu em missão para Moçambique, onde permaneceu até junho de 2014. Poucos meses antes da chegada do sacerdote, o país tinha sido “devastado por vários ciclones que provocaram grandes cheias e que resultaram em centenas de mortos e milhares de refugiados”. “Nunca esquecemos as pessoas penduradas nas árvores e uma mãe que, em cima da árvore, deu à luz a sua menina. Quando cheguei, tive a sorte de viajar por todas as missões da Consolata e pude ver ainda muita destruição. A palavra calamidade na boca de toda a gente designava a realidade na qual a maioria dos moçambicanos vivia”, recorda.

O missionário lamenta a forma como a natureza foi tão “desfavorável” àquele povo. “Nos anos logo a seguir às cheias havia escassez de tudo até porque se seguiu um longo período de seca. Foi preciso mesmo organizar a distribuição de alimentos pelas comunidades. Era necessário reconstruir hospitais, centros de saúde e escolas, mas também as capelas. Algumas delas funcionavam também como pré-escola para ajudar as crianças a aprender e a terem uma refeição. Nestes locais, as missões não são apenas centros de evangelização mas também fazem toda a diferença no campo da educação e saúde”.

Os primeiros meses do sacerdote em Moçambique foram vividos em Massinga, na província de Inhambane. Foi ali a sua “primeira experiência missionária”. Aquela era uma realidade “completamente nova” para o missionário: “outra cultura, língua, meio social, e, sobretudo, uma igreja com características muito diferentes das que estava habituado”. “Esta experiência marcou e determinou muito a minha forma de ser missionário”, sublinha.

Depois de Massinga, o padre Manuel partiu para Machava, em Maputo, onde trabalhou na ‘Rádio Maria’. “Não me sentia muito à vontade em fazer uma coisa para a qual nunca me tinha preparado, mas percebi logo que não é o missionário quem escolhe a missão mas é antes escolhido, e nem sempre as razões dessa escolha são claras para nós”. Após este período, o sacerdote voltou a deslocar-se no terreno, e partiu para a Missão de Vilanculos, onde assumiu as missões de Vilanculos e Mapinhane. “Descobri estas missões com a colaboração dos Leigos Missionários da Consolata e dos catequistas das 90 comunidades cristãs que visitava frequentemente”.

Em 2007, o missionário partiu para o Niassa – primeiro Cuamba e depois Mecanhelas. “Novamente, tudo era diferente. Foi assim que percebi o quanto é difícil para o missionário deixar o que ele considera como fruto do seu esforço e dedicação. É fundamental amar a missão, as pessoas, as comunidades, as atividades, os colaboradores. De outra forma, não poderias entregar-lhe a tua vida. Mas não te deves apegar a ela como se fosse tua propriedade. Trata-se apenas de ser um simples trabalhador da grande messe do Senhor”.

Nos últimos seis anos em que o padre Manuel esteve em Moçambique deu-se um regresso à Missão de Massinga. “Além de acompanhar as comunidades no seu crescimento, dava-se particular atenção à formação dos catequistas. Colaborei também em publicações na língua local, como catecismos e missais, e fui professor de informática para os jovens”.

A bondade dos moçambicanos é uma característica que recorda com saudade. “Quase sempre que falo com alguém que foi a Moçambique surge o comentário de que lá as pessoas são diferentes: têm um carácter pacífico, bondoso e acolhedor. Sempre experimentei isso e sempre me senti em paz e liberdade como se estivesse no meu país”. Entre as suas memórias “mais belas” estão as “visitas às comunidades”, assim como as celebrações, que “eram sempre momentos especiais, quer fossem na Igreja Matriz, na palhotinha ou debaixo da árvore”. Para o padre Manuel, que atualmente desempenha funções enquanto administrador dos Missionários da Consolata em Portugal, os seus 25 anos de sacerdócio são um momento de agradecimento. “É uma ocasião para agradecer a Deus, que me escolheu e que sempre esteve lá para me orientar, acompanhar e encorajar, e para agradecer por todas as experiências, mas, sobretudo, pelas pessoas que colocou ao meu lado e que fizeram e fazem parte da minha vida”.