A província de Cabo Delgado, em Moçambique, enfrenta desde outubro de 2017 uma rebelião armada com ataques reclamados por movimentos associados ao grupo extremista Estado Islâmico, que tem sido combatido desde 2021 com o apoio dos militares do Ruanda e dos países da África Austral, os quais se retiraram no passado mês de julho. Cristóvão Chume, ministro da Defesa moçambicano, admitiu que os terroristas continuam a criar “um sentimento de insegurança”, apesar dos “progressos” na luta contra o extremismo, mas adiantou que as ações executadas têm gerado “derrotas dos terroristas, incluindo inúmeras baixas”.
Diamantino Antunes, Missionário da Consolata e bispo de Tete, em Moçambique, recorda como um ataque em 2021, “próximo de Palma, que é a base logística das multinacionais que estão a explorar gás natural na costa norte de Moçambique”, teve uma “grande repercussão porque parou essa atividade e alertou o mundo para esse problema”.
Sete anos de ataques
Após vários meses de acalmia, no início deste ano, novos ataques de rebeldes voltaram a causar milhares de deslocados, mortes e destruição. O último grande ataque deu-se dias 10 e 11 de maio, em Macomia, com cerca de 100 insurgentes a saquearem aquela vila, provocando mortos e combates. O prelado considera que estas ofensivas têm mostrado que a “insurgência não foi debelada”. “Ela existe. Está infiltrada”.
Ao mesmo tempo, e na sequência da formação que o exército moçambicano recebe, este “tem uma atitude um pouco violenta em relação à população”, e “às vezes, até os próprios insurgentes são vistos como libertadores”, refere Diamantino Antunes. O prelado afirma que é intrigante o facto de não se conseguir “erradicar essa guerrilha”, mas sublinha que esta “é sempre difícil de combater”, e que por detrás dela existem “motivações religiosas, económicas, políticas e regionais”. Simultaneamente, parecem não existir formas de diálogo, e “não há uma reivindicação de carácter político”.
O contexto “de pobreza e de falta de oportunidades” torna-se “favorável à existência da violência” e os “jovens locais aderem” a grupos insurgentes. Tal acontece, segundo o bispo, numa província que é “rica”, mas onde existe “um grande atraso de desenvolvimento”, e em que “as pessoas esperam poder ver o resultado das atividades económicas” que lá decorrem. Segundo o prelado, poderia dar-se o caso de haver “oportunidades de emprego”, mas acontece que a atividade económica vigente é de “alta tecnologia”, e “precisa de pessoas qualificadas, que não há ali”. “Mesmo os trabalhadores moçambicanos, muitos são oriundos de outras províncias”, esclarece o bispo. “Estamos a falar de uma grande riqueza e, como se diz habitualmente, as riquezas acabam por ser a desgraça destes povos porque são alvo de cobiça, de interesses internacionais e locais, que levam a colocar em primeiro lugar o bem particular. É uma guerra que, afetando uma província, afeta um país”, lamenta o bispo de Tete, em declarações à FÁTIMA MISSIONÁRIA.