Voluntários do norte de Portugal estiveram em missão em Marrocos no último verão | Foto: DR

Sou a Maria, tenho 28 anos, e faço parte da Família dos Missionários da Consolata desde 2016. O meu percurso como voluntária iniciou em 2017, com a partida para o Uganda. Em 2019 rumei para a Tanzânia, e, em 2024, o meu caminho levou-me a Oujda, em Marrocos. Todos os dias ali chegam refugiados e migrantes que são acolhidos pelos padres Missionários da Consolata.

Eu e alguns dos elementos do grupo que em 2017 esteve em missão no Uganda partimos para cumprir o objetivo de reconstruir um dormitório e casas de banho em Oujda. Quando abraçámos este projeto, não imaginámos que tantas transformações fossem necessárias, mas com o contributo de muitas pessoas boas, paróquias e empresas que se juntaram a esta causa, foi possível fazer mais do que era esperado e, inclusive, alargar o projeto.

Na missão, a realidade é muito dura. Não só pelas condições do local, mas também pela forma como alguns jovens e famílias ali chegam, nomeadamente com doenças graves, feridas visíveis, muitos traumas e cicatrizes causadas pelo caminho e pela passagem nas fronteiras. Para muitos, o maior desafio é passar a fronteira da Argélia, onde são maltratados, torturados e rebaixados. Em Marrocos, antes da chegada a Oujda, a realidade não muda e alguns migrantes são raptados com o objetivo de se pedirem resgates às suas famílias para serem libertados. Podemos afirmar, com clareza, que a missão dos padres da Consolata é a paz e a segurança que procuram. Chocados e sensíveis com esta realidade, e conscientes de que estava nas nossas mãos conseguir mudar a situação na missão, o foco do nosso trabalho missionário foi assumir um dos pilares basilares dos Missionários da Consolata – a promoção humana.

Com garra, criatividade e vontade de deixar um amanhã melhor, em apenas 15 dias, preparámos um dormitório, uma área de convívio com duas televisões novas, um ginásio, um quarto para doentes, e uma enfermaria com 72 quilos de material médico doado. Deixámos 40 camas e colchões, três cozinhas renovadas, um fogão com forno, 1.300 euros doados para despesas de saúde, oito ventoinhas para atenuar o enorme calor que se faz sentir, um armazém de roupa organizado, limpo e reforçado com mais 112 quilos de roupa levada de Portugal, e calçado e roupa interior que comprámos para homem, mulher e criança. Procedemos ainda à pintura da fachada e hall de entrada na missão. Em construção deixámos um espaço para mais de 60 dormidas e seis novas casas de banho, tudo adjudicado.

Todo o trabalho físico foi feito com a ajuda dos nossos companheiros migrantes. Todos os dias, sete jovens oriundos do Benin, Guiné-Conacri, Sudão, Chade e Guiné-Bissau estiveram connosco a trabalhar. No final de cada dia tivemos o cuidado de pagar o seu trabalho, algo que os deixou sensibilizados e surpreendidos. Esta ajuda foi extremamente importante. Permitiu-lhes comprar alguma roupa, enviar parte à família, comprar o bilhete de transporte para a capital, e comprar um telemóvel que lhes permitia comunicar com a família.

Quando inaugurámos os dormitórios e a sala de convívio, fizemo-lo com a partilha de uma refeição, onde não faltaram bebidas e bolo. Foi um momento de emoção e sentimos que todo o trabalho e que os sacrifícios de muitos fins de semana afastados das nossas famílias para angariar fundos para esta missão foram compensados. No nosso último dia, ainda com alguns trocos na carteira, decidimos doá-los a todos os migrantes que se encontravam na missão, algo que nos deixou felizes e de coração cheio.

Não podemos esquecer as idas ao café sempre depois do almoço. Connosco levávamos os jovens e partilhávamos à volta da mesma mesa o café e um bolo, deixando os habitantes da localidade surpreendidos. Acreditamos que os habitantes de Oujda possam seguir o nosso exemplo, e acreditamos que possam passar a olhar os migrantes como irmãos, integrando-os na sociedade. Esta foi uma grande missão, de trabalho, sorrisos sinceros, obrigados sentidos e grandes lições. O povo português ficou no coração de muitos. Convido todos a estarem sensíveis a esta missão, que agora foi alvo de algumas melhorias, mas que se mantém com dificuldades e muitos desafios por resolver.

José Allamano, fundador do Instituto Missionário da Consolata, disse – “O milagre que eu desejo de vós, é que sejais missionários ardentíssimos, fidelíssimos, dedicadíssimos. Sim, ‘íssimos’ em tudo!” O voluntariado que tenho abraçado na Consolata mostrou-me que gosto de viver no superlativo absoluto sintético em tudo a que me proponho. Acabo com um sonho, inspirado nos pensamentos de José Allamano – que continuemos a ser atentíssimos, sensibilíssimos, amicíssimos, solidaríssimos e a “fazer o bem, bem feito e em silêncio”, tal como o fundador dos Missionários da Consolata pedia.

Texto: Maria Luís Fernandes