Cerca de 80 por cento da população da América Latina e das Caraíbas vive em áreas urbanas, segundo a última estimativa do Programa de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e mais de 100 milhões de pessoas vivem ainda em bairros de lata, onde não é possível levar uma vida digna. Os Missionários da Consolata estão empenhados nesta opção missionária com grande vitalidade e dinamismo, tal como proclamaram na última Conferência Regional: “Queremos continuar a viver em lugares onde ninguém quer viver; lugares com instabilidade social, raptos, violência, toxicodependência e desespero.”
A iniciativa pastoral nestas ‘villas’ – palavra usada na Argentina para os bairros de lata – nasceu do diálogo com o atual bispo, monsenhor Gustavo Carrara, o primeiro ‘sacerdote villero’ (oriundo de um bairro de lata) a ser nomeado bispo pelo Papa Francisco, e que ofereceu ao padre Maurício Guevara, missionário da Consolata que já trabalhou em Portugal, um lugar onde os jovens pudessem ter uma visão concreta de uma pastoral urbana de periferia.
Depois deste encontro, foram enviados os dois primeiros seminaristas: Gonzalo Munoz, para a paróquia de São Francisco de Assis, onde há uma casa para mulheres, e Facundo Sanchez, para a paróquia da Virgem Imaculada, onde existe uma casa para rapazes e homens em processo de recuperação. Animados por um empenho sincero, também os padres da Consolata Jean Paul Katalya e Donald Mwenesa se disponibilizaram para este trabalho nas ‘villas’, criando espaços de encontro e sustento para as comunidades.
As ‘Casas de Cristo’ nasceram na quinta-feira santa de 2008, quando o então cardeal Bergoglio, hoje Papa Francisco, celebrou o lava-pés no bairro de lata 21-24. Atualmente são cerca de 200 os centros geridos por sacerdotes diocesanos, chamados ‘sacerdotes villeros’, e por muitos colaboradores leigos.
O padre Guillermo Pinillas, outro missionário da Consolata, também acompanha os jovens recuperados na distribuição de jantares solidários, um serviço oferecido pelas crianças do ‘Lar de Cristo’. “Estes são espaços de escuta e de companheirismo e, ao acompanhá-los, aprendemos a conhecer as pessoas que querem deixar o mundo dos vícios para começar uma vida nova. Quando nos pedem esta ajuda, levamo-los às ‘Casas de Cristo’”, diz o padre Guillermo. Para os missionários, estes espaços representam não somente um sustento e acompanhamento num contexto social complexo, mas também um espaço de transformação recíproca, isto é, os missionários também aprendem e crescem muito com esta partilha de amor e de esperança.
Os três c’s da morte e os três c’s da vida
O trabalho das ‘Casas de Cristo’ nas comunidades urbanas leva a uma transformação social que vai além da mera assistência de base. Em vez de se concentrar exclusivamente sobre as necessidades imediatas, a organização adotou um método pró-ativo, que envolve as pessoas no próprio processo de recuperação, originando uma mudança de mentalidade com a substituição dos três c’s que levam à morte – em espanhol ‘calle’ (rua), ‘cárcel’ (prisão) e ‘cementerio’ (cemitério) – por outros três c’s que promovem a vida e que representam uma estrutura de oportunidade de transformação – ‘capilla’ (capela), ‘club’ (clube) e ‘colégio’ (escola).
É neste contexto que há mais de três anos se criou uma bonita amizade entre a Escola Paroquial de Villa Soldati e o Colégio de Nossa Senhora da Consolata, de Mondoza. Esta relação alimenta-se de valores partilhados, e reforça-se através de experiências que unem os vários protagonistas: estudantes e sem-abrigo. Um exemplo desta relação de amizade, proximidade e consolação, foi a visita de estudo dos jovens de Villa Soldati a Mendoza, onde foram acolhidos no refúgio das Missionárias da Consolata.
O encontro entre estudantes das duas escolas acrescentou mais dois c’s a esta aventura: o ‘c’ de Consolata e o ‘c’ de cura.
Celina Atencio e Donald Mwenesa