Maryam (nome fictício) é “uma das poucas jornalistas que restam no Afeganistão, que publicam principalmente sobre questões femininas”, de forma clandestina, devido aos elevados riscos que corre. Foto © FPA

O prémio de jovem jornalista 2024, da iniciativa da Thomson Foundation e promovido pela Associação de Imprensa Estrangeira, foi este ano atribuído a uma jornalista de quem não se sabe nem o nome nem o trabalho que realizou. Nas palavras da Columbia Journalism Review (CJR), que dá a notícia, o trabalho que faz “é tão perigoso que ela não pôde ser identificada”.

É óbvio que o júri do prémio avaliou o seu trabalho e sabe de quem se trata e, perante mais dois trabalhos nomeados para o prémio, vindos de duas jornalistas de investigação oriundas do Paquistão, entendeu atribui-lo a Maryam, nome que não é o da repórter.

A razão é que, no dizer do site da CJR, Maryam é “uma das poucas jornalistas que restam no Afeganistão, que publicam principalmente sobre questões femininas”, de forma clandestina, devido aos elevados riscos que corre.

À CJR, à qual prestou declarações, ela disse que “trabalha anonimamente, para sua própria proteção e a dos seus entrevistados”. Devido às ameaças que sobre as mulheres pairam, impostas pelo regime dos talibãs, “ela raramente se encontra com fontes em público e, às vezes, nem sequer revela a sua verdadeira identidade às pessoas que entrevista”.

Pelas mesmas razões também não compareceu à cerimónia de entrega dos prémios, que decorreu em Londres na última segunda-feira.

“O meu objetivo é dar voz às mulheres”, disse ela àquela revista. “Para mim não se trata apenas de um trabalho, é uma responsabilidade. E por essa razão, não tenho medo de fazer o que faço.”

Quando em maio último o Afeganistão sofreu inundações repentinas, Maryam falou com mulheres em regiões atingidas que lutavam para ter acesso a produtos sanitários, mas que se sentiam desconfortáveis ​​por terem de falar do período com assistentes sociais e autoridades locais, eventualmente ligadas aos talibãs.  Em julho, fez uma reportagem sobre o encerramento forçado de restaurantes exclusivos de mulheres, os quais, segundo ela, permaneciam como dos “poucos lugares seguros para as trabalhadoras afegãs, que persistiam”. Foi de resto este o trabalho que lhe valeu o prémio de jovem jornalista 2024.

O trabalho da CJR publica vários exemplos dos cuidados que a jornalista tem de desenvolver para que, em qualquer peça que escreve, não se comprometa nem comprometa as suas fontes e intermediários.

Recorde-se que, desde que reocupou o poder, em 2021, o regime dos talibãs proibiu as mulheres de frequentar a universidade e exigiu que cobrissem totalmente o corpo e o rosto para circularem em espaços públicos [ver 7Margens]. Já este ano, proibiu igualmente que as vozes das mulheres fossem ouvidas em público.

Texto redigido por 7Margens, ao abrigo de uma parceria com a Fátima Missionária.