Não há dúvida de que a situação de pobreza em que vivem muitas pessoas é fruto de políticas que favorecem um pequeno número de pessoas, geralmente detentoras de muito poder e interesses, mas que excluem ou ignoram o bem comum
Não há dúvida de que a situação de pobreza em que vivem muitas pessoas é fruto de políticas que favorecem um pequeno número de pessoas, geralmente detentoras de muito poder e interesses, mas que excluem ou ignoram o bem comumRecentemente estive a rever fotos de anos anteriores, em especial de 2007, um ano que me marcou imenso pelas experiências únicas que Deus me ofereceu, tanto como missionário, como enquanto amante deste mundo, dos seus povos e culturas. Estas experiências ocorreram no âmbito de viagens que fiz relacionadas com o meu trabalho e sacerdócio. Visitei o Quénia em janeiro desse ano para um encontro de editores das revistas missionárias do nosso Instituto, pois fui diretor da nossa revista coreana; participando também no Fórum Social Mundial; depois, em outubro, participei num curso de formação permanente para missionários com cerca de dez anos de ordenação que teve lugar no Brasil, e que durou três meses. Foi, sem dúvida, uma bênção enorme, pois tive assim a possibilidade de conhecer mais alguns países, sobretudo do ponto de vista missionário. É neste contexto que se enquadra a reflexão que vos proponho. Visitando algumas das nossas missões e paróquias do Quénia e do Brasil, pude ver o resultado de anos de trabalho incansável no meio de populações carenciadas a vários níveis, nomeadamente religioso, social e económico. Vi também situações que me marcaram profundamente, pois embora soubesse que elas existiam, uma coisa é vê-las na televisão, outra é vê-las diretamente. Destaco duas situações particulares de um nível extremo de pobreza, embora a primeira seja bem mais dura que a segunda: a Kibera, ou seja, o mais famoso bairro de lata de Nairobi, capital do Quénia, considerado por muitos o maior da África, que acolhe mais de 800 mil pessoas; e a favela de Peri, na zona norte de São Paulo, no Brasil. Ter presenciado tal miséria fez-me questionar ainda mais a credibilidade daqueles que se autointitulam servidores do povo, ou seja, os políticos e agentes económicos e até mesmo gente ligada à religião. Não há dúvida de que a situação de pobreza (não só económica) em que vivem muitas pessoas no mundo é fruto de políticas que favorecem um pequeno número de pessoas, geralmente detentoras de muito poder e interesses de vária ordem, mas que excluem ou ignoram o bem comum. Por exemplo, durante a minha estadia no Brasil, acompanhei as manobras políticas do Senado, bastante agitadas na altura por casos de corrupção que envolviam o chefe máximo da mesma entidade. Eles, os ditos servidores, nada ou pouco mais fazem que engordar as suas contas bancárias, enquanto a maior parte do povo é obrigado a sobreviver numa selva de incompetência, má gestão, falta de infraestruturas (sobretudo relacionadas com a saúde e a educação), de emprego, de oportunidades para melhorarem o seu nível de vida. Tive também a oportunidade de conhecer uma nossa missionária da Consolata, italiana, que trabalhou nas favelas do Peri por mais de 30 anos: uma vida dedicada ao amor e ao serviço dos mais pobres, em especial de crianças. Vi como o poder maior que liberta, promove e dignifica o ser humano é o poder do amor, nas suas mais variadas formas. E vi também, como vi noutros missionários que conheci noutras latitudes, a alegria e felicidade que emanava do seu discurso e forma de estar e conviver com as pessoas, uma forma que me falava do Cristo que a escolheu, chamou e convidou para ser sua discípula, amiga e missionária. E a única forma de poder que não corrompe nem destrói, que não abusa nem discrimina, que não condena nem faz sofrer é o amor. O mesmo que Jesus anunciou e praticou, convidando-nos a fazer o mesmo uns com os outros.como podemos usar este poder? Uma das formas mais práticas, profundas, significativas e libertadoras de praticar e partilhar este amor é através da vocação missionária, nas suas variadas formas. Se Cristo te interpelar, não tenhas medo de responder sim, porque a messe é cada vez maior e os trabalhadores cada vez menos.