Papa Francisco na Indonésia, em setembro de 2024 | Foto: Vatican News

“Atreve-te sempre ao sonho da fraternidade! Atreve-te a semear o amor, a percorrer o caminho do diálogo com confiança e a ser construtor da unidade e de paz!” – foi o desafio lançado pelo Papa Francisco às 100 mil pessoas que o escutavam durante a missa celebrada em Jacarta, na tarde de quinta-feira, 5 de setembro. Antes, na Mesquita Istiq’la, Francisco dissera que as religiões deviam unir-se na superação das “duas graves crises que o nosso mundo enfrenta: a desumanização e as alterações climáticas”.

“Isto é o que significa ser católico, estar junto”, disse Laura Brigitta ao correspondente do National Catholic Reporter, Christopher White, que acompanha a viagem papal à Ásia e Oceânia. O depoimento foi recolhido momentos antes de Francisco entrar no estádio Gelora Bung Karnoe. “Às vezes temos de gritar para mostrar a nossa existência”, acrescentou Brigitta, de 27 anos, de Jacarta, recordando os desafios de ser católico na Indonésia, de maioria muçulmana, ao comentar o caloroso acolhimento que o Papa recebeu da multidão apinhada no estádio. “A Indonésia precisa da presença dele” – concluiu Brigitta.

A missa, celebrada em memória de Santa Teresa de Calcutá, contou com orações nas línguas regionais de Jawa, Toraja, Manggarai, Batak Toba, Dayak Kanayatn e Papua, e foi um dos três momentos marcantes do terceiro e último dia de Francisco na Indonésia. De manhã assinara na Mesquita Istiq’la, com o Grande-Imã Nasaruddin Umar, a Declaração Conjunta de Istiqlal 2024: Promover a Harmonia Religiosa para o Bem da Humanidade, seguindo depois para um encontro com pessoas com deficiência na sede da Conferência Episcopal da Indonésia.

Aqui, o Papa ouviu testemunhos de duas pessoas com deficiência a quem qualificou de “pequenas estrelas brilhantes no céu deste arquipélago” e incentivou a descobrir “dia a dia quanto vale a pena estar juntos”, porque “todos precisamos uns dos outros” e a fazer das suas vidas “um presente para os outros”.

As religiões a favor da dignidade humana

Declaração Conjunta de Istiqlal 2024, identifica as alterações climáticas e a desumanização como as duas graves crises que o mundo enfrenta hoje e afirma que o diálogo inter-religioso é uma ferramenta eficaz para resolver conflitos locais e globais. “Os valores partilhados pelas nossas tradições religiosas devem ser efetivamente promovidos, a fim de derrotar a cultura de violência e indiferença que aflige o nosso mundo. (…) Na verdade, os valores religiosos devem ser orientados para a promoção de uma cultura de respeito, dignidade, compaixão, reconciliação e solidariedade fraterna, a fim de superar tanto a desumanização como a destruição ambiental”, pode ler-se no curto documento de menos de 400 palavras que é coerente com tantos outros textos que Francisco tem escrito na última década. De facto, tal como a declaração de Abu Dhabi assinada com o Grande-Imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyeb, também este documento identifica claramente a “exploração humana da criação” como contribuindo para as “alterações climáticas” e lamenta que a “atual crise ambiental se tenha tornado um obstáculo à coexistência harmoniosa dos povos”.

Reconhecendo que frequentemente as religiões são usadas para prolongar situações desumanas, a declaração sustenta que “os líderes religiosos devem cooperar na resposta às crises acima mencionadas, identificando as suas causas e tomando as medidas adequada”, porque “as nossas crenças e rituais religiosos têm uma capacidade particular de falar ao coração humano e, assim, promover um respeito mais profundo pela dignidade humana”. Além disso, “o diálogo inter-religioso deve ser reconhecido como um instrumento eficaz para resolver conflitos locais, regionais e internacionais, especialmente aqueles incitados pela distorção abusiva da religião”.

Após a cerimónia de assinatura da declaração, em que foram lidos trechos do Alcorão e do Evangelho, o Papa Francisco e o Grande-Imã Nasaruddin Umar percorreram o Túnel da Fraternidade que liga a Mesquita Istiq’lal à Catedral de Nossa Senhora da Assunção, tendo o Papa afirmado: “Nós, que pertencemos a diferentes tradições religiosas, temos um papel a desempenhar para ajudar todos a passar pelos túneis da vida com os olhos voltados para a luz. Então, no final da jornada, poderemos reconhecer naqueles que caminharam ao nosso lado, um irmão, uma irmã, com quem podemos compartilhar a vida e apoiar-nos mutuamente.”

Francisco despede-se da Indonésia na manhã desta sexta-feira, dia 6 de setembro, seguindo para a Papua Nova-Guiné, onde ficará até dia 9. De seguida, estará três dias em Timor-Leste, seguindo depois para Singapura e regressando a Roma ao fim da manhã de 13 de setembro.

Na Papua Nova-Guiné, país em que grande parte do território pode vir a ser submergido pelas águas do Oceano Pacífico se o aquecimento global não for rapidamente estancado, Francisco não deixará de abordar a questão ambiental e propor a sua reflexão sobre o cuidado com a criação e a vida digna do homem.

Texto redigido por Jorge Wemans/jornal 7Margens, ao abrigo da parceria com a Fátima Missionária.